07.01.2016 / Histórias Inspiradoras
Andréa Pontes: a campeã ensina a viver

“Chega um momento na vida em que é ou vai, ou continua afundando. Eu não tive opção”. É o que diz Andréa Pontes sobre seu grande feito: o dia em que decidiu aceitar a cadeira de rodas, sair do quarto e viver. Hoje campeã de paracanoagem e esperança de medalha para o Brasil nos Jogos do Rio, a advogada especialista em ciências criminais tinha apenas 24 anos quando ficou paraplégica depois de um acidente de carro, em 2007.

O sorriso sempre farto é característica da campeã de paracanoagem Andréa Pontes

O sorriso sempre farto é característica da belíssima campeã de paracanoagem Andréa Pontes

Gaúcha de Pelotas, Andréa, 32 anos, é difícil de decifrar. Ao mesmo tempo em que diz ser mais emoção que razão, muitas vezes mostra concentração racional e obstinação de líder. Diz que nunca parou para pensar em suas muitas vitórias, nem mesmo se emocionou com elas. “Sabe quando você mira uma reta e vai? A vida é corrida e eu estou sempre em busca de algo novo, da próxima conquista. Quando olham para um atleta veem muito o glamour e se esquecem de que atleta tem outro rendimento, é trabalho árduo e 100% dedicação”. Humilde, ela parece apenas aceitar – e não enaltecer – quando ouve que sua história de superação é um exemplo para as pessoas. “Gosto muito da palavra resiliência e acho que a todo momento a gente é capaz de se sobrepor”.

A história inspiradora de Andréa começou quando ela saiu de casa num domingo de Carnaval para ir à praia com as amigas e, depois de uma fratura na vértebra dorsal e uma lesão medular, voltou para a casa dos pais sem os movimentos dos seios para baixo. “Eu tinha muita vergonha, não aceitava. Eu estava tão triste com a vida, sem opção. Eu pensava: ‘isso aqui não é vida’. Tinha muito medo de encarar qualquer coisa, me sentia constrangida e decidi: ‘vou mudar'”.

O primeiro obstáculo foi uma viagem de Pelotas a Porto Alegre em ônibus não adaptado. A partir daí, veio muita coisa para encarar na tentativa de se superar sempre. Mestrado em Responsabilidade Civil na Universidade de Granada, na Espanha, e longo período indo a Brasília, em intenso tratamento no Hospital Sarah Kubitschek. Numa dessas temporadas no Distrito Federal, num dia de calor, recebeu de uma amiga o convite para remar no Lago Paranoá. Mesmo sem caiaque adaptado, logo na primeira remada, a força de Andréa chamou a atenção da treinadora Diana Nishimura, que estava por lá e a convidou para um teste. Logo, a atleta se tornou vice-campeã Sul-Americana no Chile, em 2013, campeã brasileira, campeã Sul-Americana em 2014 e conseguiu ótimas posições em mundiais. Em 2015, ficou em segundo lugar no Pan. A rotina de treinos (três por dia) está pesada para, em maio, Andréa começar a tentar sua vaga nas Paralimpíadas da Rio 2016, em setembro. Terá pouco tempo. E admite que ser ouro no Brasil vai fazê-la olhar pra trás pela primeira vez: “Aí sim vou poder comemorar a conquista, vou parar para pensar no que passei até aqui”.

Tudo o que Andréa e a gente que está na torcida mais quer é vê-la vencer no Rio. Antes, porém, aproveitando a conversa com o Eu Vejo Beleza, peço para Andréa deixar um conselho de campeã. “Acho que cada um tem seu tempo e deve respeitar o próprio luto. Quando o período de aceitação da dificuldade passa e você cai na real, as coisas acontecem. Meu conselho é: revoltem-se! A gente tem sempre que se revoltar com a acomodação e escolher viver”.

IMG_7761

A leveza da atleta veio depois de um período de luto e da aceitação da cadeira de rodas

IMG_7765

Treino pesado é com ela. São treinamentos de força, no lago e sessões de fisioterapia. Todo cuidado é pouco com os ombros

Andréa (à esquerda) com a Seleção Brasileira de Paracanoagem em Milão, no Mundial do ano passado

Andréa (à esquerda) com a Seleção Brasileira de Paracanoagem em Milão, no Mundial do ano passado

Remada forte, muita dedicação e disciplina devolveram a Andréa a sensação de liberdade

Remada forte, muita dedicação e disciplina devolveram a Andréa a sensação de liberdade

Fotos de arquivo pessoal cedidas pela atleta