25.05.2016 / Crônicas
Roma, hoje?

Jardins, arquitetura, fontes, construções de tijolos vermelhos e a luz do sol. Essa mistura, entre ciprestes e oliveiras, é o cenário perfeito dos meus sonhos, cultuado em filmes e mais filmes e numa viagem a Roma. Foi tão grande a vivência que um amigo sempre me pergunta: “Quantas vezes você foi a Roma mesmo?”. Ele já havia morado na Itália e sabia que eu havia ficado apenas oito dias. Mas a cada encontro nosso, eu tinha uma história nova para lembrar e me fazer feliz. As comidas que comi, as pessoas que conheci, os vinhos, os doces, as praças, o Vaticano, esbarrar numa coisa construída há dois mil anos.

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Eu estava prestes a fazer 28 anos quando decidi realizar o sonho de conhecer a cidade viva e tomei a importante decisão de passar o primeiro aniversário sozinha na vida. Em Trastevere, o bairro boêmio, cantaram “tanti auguri a te”, o restaurante lotado acompanhou com palmas. E eu não conhecia ninguém, apenas Rosa e José. Eles eram de São Paulo e pegamos o mesmo passeio com o nome brega de “Roma by night”. Amorosos, sentaram-se comigo e um rapaz brasileiro que também viajara sozinho. Eu os conheci no saguão do hotel, próximo à Praça da República. Esperávamos os quartos e, marinheira de primeira viagem, falei, sentindo-me esperta: “Vou para o Vaticano”. Ela contrariou o marido. “Posso ir com você?”. Acabáramos de nos conhecer. Eu disse: “Pode. Vamos para a estação de trem”. Tonta eu. Quando chegamos ao Vaticano, já prestes a fechar as portas do museu, uma chuva caiu, compramos um guarda-chuva e voltamos. Eu parei para ler minhas anotações: “Para o Vaticano, reserve ao menos um dia”.

Alguns dias depois, nos encontramos na entrada da Basílica de São Pedro. Ela tinha entre 65 e 70 anos e ele era uns seis anos mais velho. Era o sonho da vida dela, assim como era o meu, estar ali. Tivemos a nossa vivência, nos encontramos outras vezes. Num dia, fomos jantar perto do hotel e, bêbados, sem querer acordamos um homem que dormia na rua. Estava frio e ele ficou revoltado por ser acordado por nós. Corremos dele uns quarteirões e chegamos ofegantes ao hotel. Rimos muito. Muito excitada com tudo o que estava experimentando, liguei para o meu marido e deixei um recado na secretária eletrônica: “Se eu morrer, não fique triste. Eu estou muito feliz!”. Era enorme a emoção.

Impressionante como a gente deixa para viver pouco antes de morrer. Sonhos que planejamos até lá, ou para realizar antes desse dia, que, ignoramos, pode ser daqui a pouco. Essa viagem foi no ano 2000 e eu não vou esquecer a magia daqueles oito dias. Eles se multiplicaram a ponto de o meu amigo me perguntar até hoje: “Quantas vezes você foi a Roma mesmo?” – e eu já voltei depois. No dia seguinte daquela noite, conheci Pompeia através das palavras de um guia maravilhoso, apaixonado por história e que me passou cada detalhe como se tivéssemos vivido ali antes da erupção do Vesúvio.

(…) Papai e mamãe compraram uma casa de praia dos sonhos e só usufruíram por um ano, pois, é clichê, mas a vida não dá garantias. E ele logo morreu. “A vida não dá garantia”. Odeio quando me dizem isso. Como assim ousam não me dar garantia? Por isso eu acho, por mais simplório que seja, que cada dia não pode ser tratado como apenas mais um. É fácil as nossas convicções caírem por terra. Basta a gente querer. Não é preciso provar nada para ninguém – feliz de quem consegue viver assim, respeitando-se, e respeitando o próximo. A vida é hoje e é nossa. A gente tem que fazer o que deseja. Tenho nostalgia de um tempo que não vivi, em que a arquitetura era pensada e valorizada, “perdia-se” tempo com o aprendizado, calma era arma do jogo.

Rosa e José morreram? Na minha fantasia, felizes. E eu feliz por eles. Ela me contou que pegaria aquele trem comigo de novo, pois desde criança, sonhava conhecer Roma. Que bom que ela realizou. E eu vi. Nunca vou esquecer.

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Fotos: reproduções/ Roma