19.06.2015 / Crônicas
Cordialidade

A palavra que dá título a este texto parece um verbete em desuso, uma palavra antiga, daquelas ditas por nossos avós. Interessante observar como até seu som parece ultrapassado, datado. E o quanto isso é elemento para traçar um paralelo com sua força (fraqueza?) semântica nos dias de hoje.

Ser cordial está démodé? Ou, para usar uma expressão atual, é old-fashioned? Ou seja, saiu de moda? Ser cordial será, sempre, avant-garde, vanguarda, à frente de nosso tempo, bonito, ousado. Sim, pois é ousado, num mundo com tanta descortesia, insistirmos na beleza ritual da cordialidade. Manter-se gentil é como uma gotinha de óleo na água. Você está ali boiando, bolinha de azeite intacta. Podem te achatar no canto da chaleira, mexer com a colher, suas partículas se unem novamente, numa força única  de intuito, de gentileza escorregadia de óleo. Permanecer único em seu meio, indestrutível, apesar de forças contrárias.

Façamos um exercício e sejamos cordiais. Alguém vem se queixar de um problema que depende, em parte, da sua atenção na resolução. Tente ouvi-lo, sem sair na defensiva. Recebi a visita de um vizinho engenheiro, que atendeu prontamente ao meu pedido de verificar um alto-relevo no meu teto, problema proveniente, provavelmente, de seu apartamento. Ao invés de fugir da responsabilidade, ele imediatamente atendeu minha solicitação, marcou dia e hora e estava na minha casa no horário combinado para recebê-lo. Assim como sua disposição em encarar o problema, também eu estava preparada parar abrir a porta com um sorriso, pois nenhum de nós queríamos mais problemas na vida. Assim, sem sofrimento, com policiamento sobre nosso humor e sobre nosso comportamento perante o ‘oponente’, podemos seguir sem guerra. Basta ser cortês.

Quantos motoristas de táxi despreparados hoje circulam por nossa cidade? Quanta descortesia. Prestam um serviço achando que estão lhe prestando um favor, dando-lhe uma carona. Entrei em um e disparei “bom dia!”, bem alegre, em alto e bom tom, quase irritante em minha felicidade. O motorista olhou pelo espelho, riu e devolveu: “Com esse seu ‘bom dia’, ganhei o meu! Estou cansado de passageiro estúpido!” Quer dizer: tudo depende do lado em que você está.

Sejamos modernos, sejamos cordiais.