19.06.2015 / Crônicas
Estar presente

O burrinho de pelúcia trazido de Santorini estava lá em cima da cama. Ele parecia um pouco encalorado por conta da sensação térmica desses dias quentes, mas imediatamente veio a imagem da brisa sobre ele numa das vielas da ilha grega. Tudo branco ao redor, céu azul e vento incessante. Se você parar para admirar o céu, vai reparar: ele não está lá estagnado, as nuvens passam sem parar em filetes brancos e não fazem floquinhos. Explorando a ilha, num beco deserto, com chão de pedras grandes, lá estavam dezenas de burrinhos cinzas como suvenires: além do que enfeita a cama, havia com alças de bolsinha e como marionetes. Era passar por eles e ver seus pelinhos ventando. Às vezes uma sensação pode ser embalada, impressionante. Comprei também um de bolsa para dar de presente e pensei: será que a pessoa deu o devido valor?

Um presente dado com a intenção mais pura é a coisa mais linda. Como encontrar uma garrafa de gênio e poder fazer três pedidos. Certos presentes ou objetos herdados – e hoje noto muito os que vieram de quem já morreu -, podem, sim, trazer o gênio da lâmpada de dentro da garrafa: e de repente eu sinto o perfume de um amigo que nunca mais vi; vejo o sorriso da minha avó ao falar das taças vermelhas de cristal; relembro a Toulouse contada por minha mãe através do bordado de uma bonequinha num cartão postal. Presente não se resume a pagar caro e está aí um grande desafio/erro. Me sinto muito mais feliz ao ganhar uma geleia de damasco do lanche que a pessoa pediu num museu distante (teve o cuidado de levar para o hotel, embalou, reservou um espaço na mala, cruzou oceanos, tirou da mala e me deu) do que ganhar um aparelho eletrônico caríssimo que eu não tinha o menor interesse por.

Tem aquela fase da vida que os pais e avós preferem nos dar um envelopinho com dinheiro e a gente até gosta, afinal, estamos na adolescência e eles não entendem nada sobre nós. Mas no correr da vida, receber um presente dado por obrigação é uma situação irritante. Mais ou menos aquele sensação de quando você se esmera para encontrar um presente para o seu amigo oculto e recebe uma coisa horrível em troca, que não tem nada a ver com você. Se as pessoas fossem mais cuidadosas, não seriam necessárias aquelas listas com o que cada um quer ganhar no amigo oculto. Quer coisa mais sem graça? Bastaria que a gente se dedicasse um pouco a observar o gosto do outro. Atitude cada vez mais em falta no mercado. Ando um pouco impaciente para pessoas insensíveis, elas são um retrocesso para o mundo.