18.06.2015 / Crônicas
Sem muito trabalho

As coisas podiam ser mais simples. Sem medo, sem acontecimentos inesperados, sem narrações tensas quando só queremos um pouco de música suave. Poderiam não nos perturbar e, em troca, nós não perturbaríamos também. Não diríamos coisas negativas, não entraríamos nas pilhas erradas, não encontraríamos aquele amigo que adora ouvir as nossas reclamações quando a gente quer reclamar.

Não choraríamos com facilidade diante da fila do Into, não precisaríamos falar frases idiotas como “o pior é que as pessoas na fila têm problemas de locomoção” (para não levar um fora em resposta, de alguém com visão objetiva, que “é por isso que elas estão lá”). Se as coisas fossem simples, dormir pelo menos dez horas por dia aliviaria as dores de adultos e crianças, como disse um estudo divulgado na semana passada.

As coisas podiam ser mais simples. Não haveria mal-entendidos, não flagraríamos o olhar perdido de quem acabou de perder o chão sem poder interferir, não fingiríamos frieza. Abraçaríamos querendo abraçar, sorriríamos querendo sorrir, desprezaríamos querendo desprezar. As flores enfeitariam a nossa casa sem que precisássemos tirá-las da natureza. As de plástico também não destruiriam a natureza e levariam menos anos para se decompor.
Se as coisas fossem mais simples, a gente teria direito a fazer piada e ser malvado uma vez, e todos entenderiam os nossos deboches, sem que precisássemos do ponto da ironia desejado por Ziraldo. Este seria um ponto para explicar que, calma, você não quis dizer aquilo que estava entre aspas daquela forma que o outro entendeu, foi só uma ironia.

Beberíamos mais chopes para ficarmos bem, não nos feriríamos com o que dá errado, não interpretaríamos mal o que o outro disse. Demonstraríamos bondade quando quiséssemos ser bons; e a verdade quando quiséssemos ser verdadeiros. Contaríamos mais histórias. Álcool faria tão bem quanto água.

As coisas poderiam ser mais simples. Os anos passariam e tudo iria clareando, os caminhos iriam se abrindo, nós seríamos de massinha e iríamos nos moldando. E não o contrário, pois endurecer dói.