26.09.2015 / Crônicas
Uma ponte no caminho

Despediram-se corriqueiramente. Não sabia quando voltaria a vê-la. Estava uma brisa leve e seguiu andando firmemente, como se aquela brisa aplacasse a quentura do seu rosto, emocionado com aquele adeus. Sempre faziam assim, a pedido de uma delas, há muito tempo atrás. Querendo ser leve, odiava despedidas, por isso não queria botar peso quando elas aconteciam.

“Tchau, tchau!”, disse, fechando o portão do edifício. A outra olhou pra trás, nunca conseguia simplesmente partir. “Você vai amanhã?” “Segunda”, respondeu. “Ah, tá. Boa vida!”, desejou, querendo dizer viagem, mas saiu assim. Saiu o que estava em seu coração.

Sempre amaram viajar e sempre desejaram que a outra tivesse uma boa vida. E no geral, tinham.

Seguiu atravessando ruas com o vento geladinho equilibrando suas emoções e escovando seus cabelos. Há muitos anos, não andava por aquelas ruas de sua infância e adolescência. Há muito perdera a conexão com aquela cidade, que, agora, por algum motivo maior, fazia-se presente em suas lembranças com uma força gigantesca, contra a qual não podia lutar. Por isso não a ignorou, como de costume. Olhou todas as lojas e prédios, que não via com aquela atenção desde o fim dos anos 80, quando passeava por ali com sua bicicleta Ceci azul marinho.

A outra partiu primeiro, para a Holanda. Quando voltou, a segunda já estava fora dali. Foi aí que elas começaram a crescer, e viram que precisavam sair, buscar novos horizontes.

“Amo o Brasil, sempre virei visitar. Mas aqui o coração tem muitos sobressaltos”, afirmou, no último almoço. “Que lindo isso. É verdade”, concordou. A outra: “Fico nervosa, querendo reencontrar a minha paz. Aqui as pessoas se separam facilmente, desistem rápido de tudo, estão intolerantes”.

Será tão difícil buscar um estado de espírito calmo, genuinamente puro, vivendo aqui? Hoje quem ficou (e mudou apenas de cidade) pensa que sim. Gosta de cores fortes, paixões e sobressaltos, mas anda vendo muito mais beleza nos tons pastéis. É um modo de recuperar a doçura, lembrar das raízes, não se sentir sem chão, trem sem dono.

Seguiu andando para o ponto de ônibus, sentindo como se fosse hoje quantos sobressaltos aquelas esquinas lhe deram… tentando chegar a algum lugar. Olhou a vista tão bela, cruzou a ponte e voltou à realidade. Muitas vezes, o perto está tão longe! Saudade é o elo entre as distâncias. E que bom que ela é sentida.