24.06.2015 / Crônicas

Todo dia por volta das 17h o pipoqueiro estaciona ali. Começa um movimento de saída do trabalho e volta para casa, um vaivém de pessoas, peculiar para quem não trabalha num horário convencional. A rotina da grande massa se repete. Observar o comum é curioso, é a desobrigação, o descompromisso com os horários do dia a dia. É ver a vida passar e não ter que se preocupar. Quando se sai de um contexto estressante para simplesmente ser inserido num outro, de fazer coisas completamente diferentes do dia a dia anterior, ter outras obrigações, ou apenas não fazer nada, quando se assume ...[continuar lendo]

24.06.2015 / Crônicas

Eram três na mesa ao lado. “Nesses mais de 30 anos como geriatra, sempre digo para os meus pacientes: o que dá longevidade é a felicidade. Não se concentre em arrastar âncoras, na vida nós temos que carregar baloes”, ele disse. Uma delas já tinha ouvido dele a frase e concordou, olhos brilhando. A outra se emoconou: “Nossa, que lindo, só conhecia a frase da âncora”. E seguiram a conversa falando de dois tipos de pessoas: as alegres e as tristes. As tristes não são assim somente em casos de motivos de tristeza, mas em tudo buscam a infelicidade. Estao sempre cansadas, recl...[continuar lendo]

24.06.2015 / Crônicas

Era como uma criancinha frenética, uma adolescente se arrumando para sair, a boca tremendo de nervosa, dentes batendo, frio na espinha mesmo no calor do verão. Fazia dancinhas no espelho horas e acabava sempre com coreografias de jazz que nunca aprendeu, rodando os braços em círculos e chutando o ar. Mandava uma amiga fazer as vezes de `pastilha`, aquilo que se botava antes das lâmpadas para fazer a luz piscar sem parar, feito discoteca. Deixava-se contagiar pela música mesmo. Se empolgava com tudo até a euphoria. Tanto é que tinha mania de inventar grafia para as palavras: escrevia...[continuar lendo]

24.06.2015 / Crônicas

Arrumar não é jogar no lixo. As pessoas confundem as coisas: “Ah, vamos arrumar. Vamos dar essa mesa pé palito dos anos 50, vamos pegar esse livro de arte sobre mar – afinal, eu odeio mar – e esse chapéu de plumas verdes que foi da vovó e jogar tudo fora”. Agora, anda. Feng shui! Essa casa está precisando de energia fluindo. Vamos logo, vamos logo. Ei, como assim? Não é assim. As coisas têm uma história. Está certo, não vamos virar personagens do programa “Os Acumuladores”, que eu nao sei por que eu acabo vendo no canal a cabo, mas vamos ter memória. E memória. Ass...[continuar lendo]

24.06.2015 / Crônicas

Luiza foi pega de surpresa. “Tia Lulu, faz o barulho da girafa pra mim?”. Sentiu-se desafiada e perdida, pois nunca havia parado para pensar sobre isso. E agora? Qual o som da girafa? Inventou qualquer barulho na hora para evitar que a menina descobrisse que, diferente do que pensava, tia Lulu não sabia tudo. Depois foi procurar no Google e descobriu que o animal não tem voz, mas, mesmo silencioso, pode emitir alguns gemidos mais graves. Começou a pensar no quanto costuma falar muito e na importância do silêncio. Uma vez ouviu: “O silêncio é de ouro”. Mas raramente sabia fica...[continuar lendo]

24.06.2015 / Crônicas

Revirando o armário para a mudança, achou um saco com as fantasias de Carnaval. Estavam lá um collant preto bordado com paetês de ‘Garota do Fantástico’ (do tempo em que o dominical da Globo exibia umas mulheres na abertura), a odalisca com o chapeuzinho feito de caixa de Catupiry forrada com cetim azul e metaloide, a cabeça de burrinho da festa do colégio. “Mas como mamãe teve coragem de vestir isso em mim de novo, por que não me fantasiou de havaiana?”, perguntou para o irmão. “Não sei, mas sei que você odiou quando eles voltaram daquela segunda viagem de lua de mel e t...[continuar lendo]

24.06.2015 / Crônicas

Minha caneleira está lá sentadinha na poltrona. Linda, eu olho para ela e ela para mim desde o Natal de 2009. Resoluta, fui atrás dela como quem vai atrás de um grande amor. Achei o modelo ideal, não muito pesada, tecido bonito, azul, para não ficar tão mulherzinha. Falei para o meu amigo Mario, todo fortão: “Comprei a caneleira. Você vai ver. Exercício todo dia, pernão”. Ele riu. Ganhei livros, comprei outros, fui acumulando um monte de coisas na poltrona, até que quase dois anos depois, impulsionada por um TOC de ordem, resolvi arrumar a tal poltrona e retirá-la do quarto...[continuar lendo]

24.06.2015 / Crônicas

A descoberta da pólvora: “Hoje em dia, tenho a impressão de que a tecnologia acelerou muito o que faríamos em um dia. Com telefone, Internet, smartphone, a gente resolve tudo o tempo todo. Então, o que levaríamos um mês para fazer, levamos um dia. Ficou tudo frenético. Antigamente, você tinha que ter a ficha do orelhão. E ainda tinha que dar a sorte de encontrar um orelhão funcionando. Resolvia o assunto logo, pois o tempo acabava e a ficha caía. Mas nem tudo era assunto para telefone. Então as pessoas tinham tempo de refletir”. A mulher, de seus 65 anos, estava sendo sincera. ...[continuar lendo]

24.06.2015 / Crônicas

Filme preferido? “Castelos de Gelo e ET.” Tem um sonho impossível? “Ser campeã mundial de patinação no gelo.” Mar ou montanha? “Mar.” Sol ou lua? “Sol.” Já beijou? Quem? “Não posso revelar.” Qual sua idade? “14 anos.” Antigamente, na época da minha adolescência, a melhor parte do recreio era responder questionários. Eu trocava até o tempo da fila do cheeseburger e não comia para responder logo. A mania começou com umas 32 perguntas, passou para 64 e teve uma amiga que conseguiu formular 131 perguntas. Mas, claro, deve ter tido a ajuda da mãe, comentavam. Po...[continuar lendo]

24.06.2015 / Crônicas

O casal não acordou e não embarcou no avião que caiu rumo a Paris. A moça bonita resolveu ir para casa e não emendou naquela festa, onde viria a conhecer seu amor. Com raiva, um outro rapaz pegou o primeiro ônibus que passou. Depois de terminar um namoro, a menina não saiu com os irmãos para o bar da moda. Um outro casal: o namorado mentiu, dizendo que a havia traído, e a mulher saiu de noite sozinha pelas ruas para beijar alguém. Só anos depois ele contou a verdade: era mentira. O despertador não tocou e você perdeu a hora. Acontece o tempo todo. Mas muda o rumo e a vida segue...[continuar lendo]